Navegando pelo Comércio, Sustentabilidade e Resiliência da Cadeia de Suprimentos: Lições Aprendidas com Emergências Climáticas Recentes

Outubro 2024 – 47ª edição

A Women Inside Trade (WIT), em parceria com o Comitê Brasileiro da Câmara de Comércio Internacional (ICC Brasil) e com o apoio do escritório Trench Rossi Watanabe, organizou um relevante painel no Fórum Público da Organização Mundial do Comércio (OMC) de 2024. Realizado em 11 de setembro, o painel – intitulado “Navegando pelo Comércio, Sustentabilidade e Resiliência da Cadeia de Suprimentos: Lições Aprendidas com Emergências Climáticas Recentes” – foi moderado por Déborah Melo, Diretora Jurídica e Institucional da rede WIT, e discutiu os desafios enfrentados por países vulneráveis às mudanças climáticas no contexto do comércio internacional, especialmente diante das novas regulamentações ambientais.

O tema central do Fórum deste ano foi a re-globalização, com ênfase em como políticas verdes, serviços e digitalização podem contribuir para um comércio mais sustentável. Na programação do maior evento da OMC, houve um número significativo de sessões que abordou a relação entre comércio e sustentabilidade, refletindo o aumento da importância dessas questões nas discussões globais. O painel da WIT contribuiu para tal debate, analisando como as novas exigências ambientais – muitas vezes implementadas de forma unilateral – podem criar barreiras adicionais ao comércio, especialmente para países em desenvolvimento, que já enfrentam situações de vulnerabilidade.

Durante o painel da WIT, foram abordadas as consequências das emergências climáticas recentes para o comércio internacional. Um exemplo específico mencionado foi a crise no Rio Grande do Sul (Brasil), onde enchentes severas causaram destruição de infraestruturas e perda de safras, impactando as exportações de produtos como soja, celulose e tabaco. Além dos efeitos imediatos do desastre natural, o estado brasileiro precisará se adequar às novas regulamentações ambientais, que estabelecem requisitos mais rigorosos para exportar para mercados como o do continente europeu.

O embaixador do Brasil na OMC, Guilherme Patriota, destacou as medidas emergenciais adotadas pelo governo brasileiro, como a suspensão temporária das tarifas de importação de arroz, para controlar a especulação de preços no mercado interno. Além disso, ele apontou que, além da resposta imediata às enchentes, será necessário reconstruir a infraestrutura do estado para retomar as exportações de forma competitiva, enfrentando também os desafios impostos pelas novas regulamentações ambientais.

Nesse contexto, Sandra Hanni, líder global de políticas climáticas e comércio na Câmara de Comércio Internacional (ICC, na sigla em inglês), abordou a importância das tecnologias emergentes, como o blockchain, para aumentar a resiliência e a transparência nas cadeias de suprimentos globais. Segundo ela, a digitalização e a inovação tecnológica são fundamentais para que empresas e governos possam se adaptar rapidamente às novas exigências ambientais e mitigar os efeitos de futuros desastres climáticos.

Por sua vez, o especialista jurídico da OMC, Dr. Daniel Ramos, discutiu a necessidade de flexibilidade nas regulamentações comerciais em tempos de crise. Ele mencionou uma proposta do Paquistão para a criação de um mecanismo de resposta rápida a desastres climáticos, que permitiria ajustes temporários nas obrigações comerciais para países gravemente afetados por emergências climáticas. Além disso, destacou a importância do Trade Day na COP29 (no Azerbaijão) como uma oportunidade para discutir o papel do comércio internacional nas questões climáticas em um evento de grande relevância. Ramos enfatizou, ainda, que a sustentabilidade é um princípio central da OMC e que as políticas comerciais devem buscar o equilíbrio entre proteção ambiental e necessidades econômicas dos países.

Ressalta-se que o painel destacou a importância de conciliar regulamentações ambientais rigorosas com a flexibilidade comercial, especialmente para países já impactados pelas mudanças climáticas. Embora medidas, como o EUDR (Regulamento Anti Desflorestamento da União Europeia), sejam essenciais para a preservação ambiental, elas também podem representar barreiras significativas para economias vulneráveis, que precisam de tempo e apoio para se adaptarem aos novos padrões.

No contexto mais amplo do Fórum Público da OMC de 2024, ficou claro que o comércio internacional está em um momento de transição. O evento da OMC promoveu debates importantes sobre como o comércio pode se adaptar às demandas de sustentabilidade e resiliência, abordando desde os impactos das novas regulamentações ambientais até a importância da cooperação internacional para um comércio mais justo e sustentável. O painel organizado pela rede WIT refletiu exatamente essa discussão, reforçando a necessidade de cooperação entre governos, setor privado e organizações internacionais, de modo a garantir que as políticas de comércio verde não sobrecarreguem países em situações de vulnerabilidade.

Como principal conclusão do painel, observou-se a necessidade urgente de conciliar regulamentações ambientais rigorosas com a flexibilidade comercial. As medidas ambientais são essenciais para a proteção do planeta, mas é preciso também garantir que elas não sobrecarreguem ainda mais países que já estão lidando com crises humanitárias e econômicas. Isso ficou evidente na discussão do caso do Rio Grande do Sul, uma vez que, além de reconstruir a sua infraestrutura após as enchentes, o estado precisará se adaptar às regulamentações comerciais mais rígidas impostas por seus principais parceiros.

Por fim, o Fórum Público da OMC de 2024 reforçou que a transição para práticas comerciais sustentáveis deve ser realizada de forma inclusiva, garantindo que a cooperação entre governos e o setor privado esteja alinhada com as necessidades reais de adaptação às mudanças climáticas. Esse caminho, embora desafiador, é fundamental para garantir que o comércio internacional continue a prosperar sem comprometer a recuperação dos países mais vulneráveis, assegurando um futuro mais justo e equilibrado para todos.

Autora: 

Déborah Melo é mestre e doutoranda em Direito do Comércio Internacional pela USP. Atua como advogada no escritório Trench Rossi Watanabe e como Diretoria Jurídica e Institucional da rede WIT.