Quais as prioridades da CAMEX para a politica comercial brasileira?

Fevereiro 2021 – 20ª edição

  1. O governo adotou várias medidas tempestivas durante a pandemia na área de comércio. Na CAMEX, houve uma série de reduções transitórias do imposto de importação para produtos de combate à pandemia. Quais principais efeitos dessas medidas? O processo envolveu os demais países do Mercosul por ser um novo instrumento de alteração tarifária?

 

Nos últimos meses, reduzimos a zero as alíquotas do Imposto de Importação de 561 produtos relacionados ao combate à COVID, abrangendo medicamentos e seus insumos, equipamentos e materiais hospitalares, bem como insumos e máquinas para a sua produção, produtos de higienização, entre outros. O principal efeito dessas medidas foi viabilizar a aquisição mais ágil e menos onerosa de itens essenciais ao enfrentamento dessa crise sanitária sem precedentes. Quanto ao instrumento utilizado, nos amparamos no artigo 50, alínea d, do Tratado de Montevidéu, que prevê que os países da ALADI podem adotar medidas unilaterais em casos de necessidade de proteção da vida e saúde de seus cidadãos.

Uma nota pessoal: no dia em que fizemos a primeira redução tarifária, logo no início da pandemia, fiquei até mais de dez da noite na CAMEX para viabilizar a publicação da resolução o quanto antes. Naquele dia eu havia prometido à minha filha que chegaria cedo em casa, e quando cheguei, ela estava triste me esperando.

Me perguntou por que eu havia demorado, e eu respondi: “mamãe estava ajudando o Brasil a combater o coronavírus”. Ela então abriu um sorriso enorme, me abraçou apertado e disse: “valeu a pena você ter ficado até tão tarde, mamãe, estou muito orgulhosa de você!!”. Foi inevitável cair no choro…, mas, ao mesmo tempo fiquei muito feliz pelo reconhecimento dela sobre como o meu trabalho era importante para o país naquele momento. Posso afirmar que esse dia foi, com certeza, um dos pontos altos da minha carreira.

 

  1. O que se pode esperar da atuação da Camex na fase pós-pandemia e de recuperação da economia brasileira e de inserção no cenário internacional? Quais serão as prioridades em 2021?

 

A pandemia teve um efeito catalizador importante sobre algumas iniciativas que já vinham se desenhando há algum tempo na CAMEX. Uma delas é a Reforma do Sistema de Apoio Oficial às Exportações: ao longo de 2020 coordenamos um trabalho intenso de discussão com os principais stakeholders dessa agenda, tanto públicos como privados. Nos próximos meses deveremos publicar os normativos necessários ao funcionamento do novo modelo de financiamento e garantia às exportações, o que representa um avanço significativo em termos de governança e eficiência desse instrumento. Outra é a Agenda Regulatória para Melhoria do Ambiente de Investimentos, que busca conferir mais transparência e segurança jurídica ao arcabouço normativo relacionado à atração de IED no Brasil, com alinhamento às melhores práticas internacionais, especialmente às recomendações da OCDE. E, obviamente, temos a agenda negociadora de acordos de comércio, com destaque para novas frentes com a Coréia do Sul, Indonésia e Vietnã, e para a ratificação, o quanto antes, do Acordo Mercosul – União Europeia.

 

  1. Como a recente reativação do CONEX tem contribuído para a definição da política comercial brasileira? Além do CONEX, como o setor privado pode participar dos outros comitês como por exemplo o de alteração tarifária e facilitação de comércio?

 

O CONEX tem o importante papel de servir como canal de diálogo entre o governo e o setor privado sobre os temas de competência da CAMEX, e sua reativação é um importante marco nesse processo de construção colaborativa. Estamos agora, em conjunto com os representantes do setor privado, formulando o Plano de Trabalho do Conselho para os próximos dois anos, tendo como pano de fundo o direcionamento estratégico do Ministério da Economia para ampliação da inserção internacional da economia brasileira. As iniciativas do Plano de Trabalho deverão, obrigatoriamente, estar vinculadas a um dos comitês da CAMEX, tais como o de Alterações Tarifárias (CAT) e o de Facilitação de Comércio (CONFAC) mencionados por vocês. Dessa forma, garantimos o correto endereçamento das demandas que venham a surgir.

 

  1. A governança e desenho institucional da CAMEX tiveram mudanças no atual governo. Quais as principais transformações da Camex para o formato que se tem hoje e seu papel para a definição da política comercial brasileira?

 

Em termos de desenho institucional, tivemos duas mudanças significativas: a primeira dela é a participação ativa da Presidência da República no Conselho de Estratégia Comercial (que substituiu o antigo Conselho de Ministros da CAMEX), e a segunda é composição do GECEX, que conta agora com novos membros como o Ministério da Defesa, o CADE e a Secretaria Especial de Fazenda. Essas alterações na composição têm, sem sombra de dúvida, enriquecido muito os debates em torno da política comercial brasileira na medida em que incorporamos novos olhares sobre temas tradicionais. Com relação à governança, destaco também duas iniciativas relevantes: uma é a consultoria que estamos realizando com a CGU desde setembro de 2020, com foco em melhorar nossos processos internos, garantir maior transparência às decisões dos diferentes comitês da Camex e minimizar eventuais riscos de não-conformidade e conflito de interesses. A outra, também impulsionada pela pandemia, é a implantação de rotinas e controles que permitam que as deliberações dos colegiados aconteçam de forma virtual sem prejuízo de sua segurança jurídica. Avançamos muito nessa frente ao longo do último ano, o que tem permitido maior agilidade na realização das reuniões e na publicação de resoluções da CAMEX.

 

Entrevistada: Ana Repezza, Secretária Executiva Adjunta da CAMEX, é Graduada em Administração de Empresas pela UFMG, com MBA em Comércio Exterior e Negócios Internacionais pela FGV, e mestrado em Gestão Internacional pela University of London. Passou por instituições públicas e privadas, é Professora convidada dos Programas de Pós-Graduação da FGV e da ENAP e autora de livros e artigos sobre o comércio internacional.