Dezembro 2022 – 37ª edição
- Brasil e Argentina assinaram um Acordo de Reconhecimento Mútuo de Homologações Veiculares. Considerando cenário recente de retirada de fábricas automotivas do país e de dificuldades na exportação para a Argentina, quais as expectativas e desafios para o acordo?
Com o Acordo de Reconhecimento Mútuo de Homologações Veiculares, como o próprio nome diz, a expectativa é a de que se consiga simplificar e tornar mais célere o trâmite de homologação de veículos comercializados entre Brasil e Argentina, já que um país passará a reconhecer a homologação feita no outro, contribuindo ainda para a redução de custos no comércio automotivo entre os dois países.
Dentre os desafios relacionados à implementação do Acordo, podem ser citados como exemplos o aprofundamento da relação de confiança entre os reguladores, elemento essencial em um Acordo dessa natureza; a necessidade de contínua cooperação e transparência, com vistas a solucionar eventuais problemas no reconhecimento de homologações pelos reguladores e a proceder à atualização do Apêndice conforme alterações na legislação dos países sejam feitas; bem como a necessidade de mudanças nos sistemas informatizados dos reguladores de ambos os países, para que constem informações sobre os regulamentos nos certificados emitidos domesticamente.
- Inicialmente, o acordo cobrirá cerca de 80% dos itens de segurança de veículos leves de passageiro e leves de carga. Está prevista uma expansão do escopo para outras categorias de produtos automotivos. Que tipo de produtos estão em negociação para essa segunda fase? Ainda, quais os próximos passos para a entrada em vigor do acordo?
O Acordo prevê que as Partes se comprometem a avaliar a possibilidade de estender as consultas e trabalhos técnicos sobre temas regulatórios de segurança veicular para as demais categorias de veículos, o que significa, em outras palavras, que se pretende seguir analisando a regulação de cada país e eventuais diferenças entre elas, bem como a utilização de normas estrangeiras globalmente aplicadas, com vistas à ampliação do escopo do Acordo para caminhões, ônibus e motocicletas. Também se pretende realizar trabalho no mesmo sentido sobre temas ambientais (emissões de ruídos e de gases poluentes) e sobre autopeças, que possuem sistema próprio de certificação, diferente daquele utilizado para os veículos inteiros.
Para que o Acordo entre em vigor, é necessária a internalização do 45º Protocolo Adicional ao Ace-14 no ordenamento jurídico doméstico das Partes. No caso do Brasil, está em andamento esse trâmite, que será concluído por meio de edição de Decreto Presidencial. Uma vez cumprido esse trâmite, cada um deles notificará a ALADI. Tendo recebido a notificação de ambos os países, a ALADI comunicará a Brasil e Argentina. O Acordo entrará em vigor 120 dias após essa comunicação da Secretaria Geral da ALADI.
- Existe expectativa de negociações de outros acordos de harmonização ou de reconhecimento mútuo de elementos técnicos com outros países da América Latina? Há objetivos ou entendimentos a respeito do tema frente a integração regional?
É importante ressaltar que, além de eventual manifestação de interesse de uma das Partes, negociações dessa natureza implicam a necessidade de engajamento dos reguladores competentes na matéria, para intercâmbio prévio de informações e de experiências entre as Partes, para que se tenha um melhor conhecimento do sistema regulatório do parceiro comercial. Sem esse conhecimento, não é possível negociar instrumentos sobre temas regulatórios. É necessário conhecer, por exemplo, quais são os requisitos técnicos exigidos no outro país e suas diferenças em relação aos requisitos exigidos domesticamente. Outro exemplo é o sistema de homologação/certificação, que pode diferir de um país para o outro.
Atualmente, existem dispositivos negociados sobre temas regulatórios no setor automotivo com outros países da região. Por exemplo, no ACE-55, com o México, há a previsão de que se iniciem trabalhos com vistas a avaliar a possibilidade de reconhecimento mútuo de resultados de avaliação da conformidade sobre itens de segurança veicular. No ACE-74, com o Paraguai, há a previsão de cooperação técnica relativa a requisitos de segurança veicular e de temas ambientais.
No Mercosul, os trabalhos de harmonização ocorrem no âmbito da Comissão da Indústria Automotivo do Subgrupo de Trabalho no 3, que se reúne pelo menos 4 vezes ao ano.
Entrevistada: Juliana Ghizzi Pires é Bacharel e Mestre em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília. É servidora pública federal da carreira de Analista de Comércio Exterior. Desde 2010, trabalha na Secretaria de Comércio Exterior. Atualmente, exerce a função de Coordenadora-Geral de Convergência Regulatória e Barreiras às Exportações onde atua em temas regulatórios, em especial barreiras técnicas ao comércio e boas práticas regulatórias, em negociações e foros multilaterais, regionais e bilaterais.